Um ensaio em pequena escala concluiu que os bacteriófagos – vírus que infetam as bactérias – podem ser, no futuro, uma alternativa viável aos antibióticos.
Embora os antibióticos tenham já salvo um incontável número de vidas ao longo da sua já longa existência na História da Medicina, não estão, porém, isentos de problemas.
Neste sentido, a resistência aos antiobióticos está entre as principais preocupações. De facto, a Organização Mundial de Saúde destaca-a como “uma das maiores ameaças à saúde global, à segurança alimentar e ao desenvolvimento”.
Todavia, para além do iminente perigo de resistência, o uso de antibióticos traz outras preocupações.
Uma delas tem a ver com o facto de que embora sejam capazes de destruir as bactérias são, igualmente, potenciadores de doença, matando, indiscriminadamente, outras espécies de bactérias.
Ora, se parece ficar cada vez mais claro que as nossas bactérias intestinais são parte essencial da nossa saúde, então, a sua destruição em grande número terá, com certeza, consequências negativas.
É sabido, neste sentido, que muitos dos antibióticos são responsáveis por causar algum desconforto intestinal, e este é resultado do “abate” em série de bactérias.
Ora, por alguns destes motivos, a procura por alternativas aos antibióticos é uma tendência crescente. Na Universidade George Mason, nos Estados Unidos, alguns investigadores, pertencentes ao Departamento de Nutrição e Estudos Alimentares, estão a estudar o potencial terapêutico dos bacteriófagos.
O que são bacteriófagos?
Os bacteriófagos são vírus que atacam e matam as bactérias. Onde forem encontradas bactérias, há uma grande probabilidade de encontrarmos bacteriófagos por perto. De facto, são mesmo considerados os organismos mais numerosos na terra.
E se a ideia de usar vírus para combater bactérias dentro dos nossos corpos pode parecer, à partida, arriscada, a boa notícia é que os bacteriófagos apenas atacam bactérias, deixando as restantes células humanas intactas.
Para além disso, são altamente específicos para certas estirpes bacterianas.
“Usar vírus que afetam apenas determinados tipos de bactérias poupa em muito as boas bactérias do intestino, o que significará resultados benéficos para a nossa saúde a longo prazo”, explica Taylor Wallace, um dos responsáveis pela investigação.
Para investigar os potenciais benefícios do uso de bacteriófagos, os investigadores recrutaram 31 pessoas que estavam a ultrapassar questões de desconforto intestinal mas não tinham, no entanto, nenhuma doença digestiva específica associada.
O referido grupo foi dividido em dois. Metade dos participantes receberam de uma intervenção experimental – foram-lhes injetadas quatro estirpes de bacteriófagos que atacam especificamente a Escherichia coli, uma bactéria conhecida por causar problemas gastrointestinais; e a outra metade recebeu um placebo.
Após quatro semanas de tratamento, houve um período de inversão de duas semanas. Nesse momento, o grupo que tomou o placebo ingressou no tratamento dos bacteriófagos durante quatro semanas, enquanto o grupo experimental mudou para o placebo durante quatro semanas.
“Sem efeitos colaterais aparentes”
Os resultados foram encorajadores; houve uma redução significativa de um marcador inflamatório chamado interleukin 4 e a equipa registou também um aumento dos níveis das chamadas “bactérias boas”.
Por exemplo, as pessoas do grupo que tinham marcadores precoces de síndrome metabólica tiveram um aumento no Bifidobacterium spp, uma espécie de bactéria anaeróbica que atua como um probiótico benéfico para a saúde humana. Foi também registada uma redução no Clostridium perfringens, uma causa comum de intoxicação alimentar.
Mais importante do que tudo isto: nenhuma reação adversa foi registada.
Como admite Taylor Wallace: “Mostrámos, pela primeira vez, que o tratamento por bacteriófagos não traz efeitos colaterais aparentes, pelo menos a curto prazo”.
Outras aplicações
No entanto, aparentemente, os potenciais usos dos bacteriófagos para tratamento podem ir além do seu uso benéfico no que diz respeito a questões intestinais. Taylor Wallace e Tiffany Weir estão agora a começar a explorar o uso destes “assassinos” de bactérias para pensar em suplementos que ajudem a restaurar o equilíbrio no microbioma de pessoas com esta síndrome metabólica.
Tratam-se, sobretudo, de indivíduos que apresentam, normalmente, populações de bactérias intestinais alteradas em função da inflamação em curso.
Mas, a verdade, é que os bacteriófagos podem também desempenhar um papel muito importante em países em vias de desenvolvimento, e, especificamente, no caso de indivíduos que têm determinadas deficiências ao nível nutricional devido a diarreia crónica.
Curiosamente, os bacteriófagos foram usados como agentes antibacterianos nos anos 20 e 30, na Geórgia e nos Estados Unidos. Uma das razões principais pelas quais cairam em desuso foi precisamente pelo advento dos antiobióticos que eram mais fáceis de fabricar, armazenar e prescrever.
Atualmente, e com a constante ameaça da resistência aos antibióticos, uma reviravolta relativamente a este assunto pode estar nos planos de futuro.
Fonte: Medical News Today
Tradução: CBMR
Os bacteriófagos foram usados como agentes antibacterianos nos anos 20 e 30, na Geórgia e nos Estados Unidos, e cairam em desuso precisamente pelo advento dos antiobióticos que eram mais fáceis de fabricar, armazenar e prescrever.