João Barata lidera um dos principais grupos de investigação em sinalização do cancro e trabalha, há duas décadas, para compreender quais os principais mecanismos que contribuem para o desenvolvimento e progressão da leucemia.
João Barata nunca sonhou ser detective. Estaria, talvez, longe de imaginar que, em 2018, a vida lhe daria pistas para continuar a perseguir a doença que afeta, atualmente, mais de 300 mil pacientes, por ano, em todo o mundo. Líder do laboratório em Sinalização do Cancro, no Instituto de Medicina Molecular, o investigador é hoje uma das principais referências nacionais na investigação em leucemia.
Como nos explica, um dos seus principais focos é “entender como é que uma célula normal sofre um processo de transformação que a faz tornar-se numa célula maligna”. A investigação que tem conduzido ao longo dos últimos anos já lhe permitiu chegar a algumas respostas: “temos evidências de que esse processo ocorre não apenas em eventos dentro da própria célula mas também depende de eventos externos a esta. Na verdade, o ambiente em que a célula está, determina aquilo que ela é”.
Estabelecendo uma analogia entre o comportamento das células e o próprio comportamento humano, João Barata garante que, no caso das células tumorais, “é um bocadinho como a nossa educação. Aquilo que somos é determinado não apenas pelas características que herdamos dos pais, mas também pelo ambiente em que estamos”.
Assim, de acordo com o investigador, um tumor e uma célula tumoral refletem não apenas a desregulação dentro da própria célula mas também o que ocorre fora dela.
Desta forma, centrando-se nos mecanismos através dos quais as células malignas ganham vantagem sobre as células normais, João Barata pretende compreender de que modo os fatores microambientais têm impacto na evolução da leucemia.
Tendo como principal eixo de investigação a interleucina 7, um dos principais fatores que contribuem para a aceleração da leucemia, a equipa, composta por 18 investigadores, procura agora compreender como é que o recetor desta proteína consegue desvirtuar uma célula do sangue, em desenvolvimento, por forma a originar leucemia.
Para já, há, pelo menos, uma certeza: “a interleucina 7 é produzida pelo micro-ambiente em que a célula tumoral se encontra e estas células ao serem estimuladas por ela vão proliferar mais e vão ter mais resistência a certo tipos de tratamento. Logo, a interleucina 7, é muito importante para compreender a biologia destas leucemias”.
Como acrescenta João Barata, que acredita que “temos de fazer boas perguntas para encontrar melhores respostas”, é importante perceber bem a biologia do doença para poder tratá-la.
Ora, o tratamento é precisamente um dos pontos de chegada desta investigação que começa no estudo dos mecanismos básicos e celulares e se extende ao entendimento do modo como o organismo funciona, para, depois, tentar descobrir ou desenvolver novas estratégias terapêuticas.
Como explica o investigador português “ao mesmo tempo que temos estas questões muito fundamentais para entender a biologia do doença estamos, em paralelo, a tentar desenvolver ferramentas para combatê-la”.
O trabalho para desenvolver um anti-corpo para o recetor da interleucina 7 é precisamente um dos mais recentes esforços da equipa para, no futuro, tentar tratar doentes que tenham uma leucemia deste tipo.
Para já, e embora, como defende o investigador, seja necessário “ter uma perspetiva realista de que o impacto nunca é imediato”, os resultados parecem promissores. “Estamos muito entusiasmados com o que temos em mãos neste momento. Temos encontrado coisas muito interessantes e há muitas perguntas novas a surgir”.
Para além dos projetos mais ligados à leucemia e à análise de tumores cerebrais, o grupo encontra-se ainda a trabalhar num projeto na área da cronoterapia. Partindo da ideias de que as células se encontram sujeitas aos chamados ritmos circadianos, os investigadores acreditam que determinadas vias de sinalização dentro da célula, ou seja, determinadas proteínas, poderão estar, também elas, mais ou menos ativadas, consoante a altura do dia.
Ora, como esclarece o investigador, que realizou parte do seu doutoramento em Harvard, “isso significa que, em potencial, podemos usar tratamentos contra essas proteínas de forma cronoterapêutica, ou seja, em determinadas alturas do dia. Porque, a comprovar-se a nossa tese, em determinadas alturas do dia o seu efeito será maior do que noutras”.
A atuar na área da biologia do cancro, da biologia celular e molecular e das terapias dirigidas, o grupo de investigação liderado por João Barata pretende, assim, continuar a trabalhar para identificar e caracterizar um número cada vez maior de biomarcadores e de alvos moleculares que permitam o desenvolvimento de novas terapias, mais seletivas e mais eficazes, no tratamento do cancro.
“Ao mesmo tempo que temos estas questões muito fundamentais para entender a biologia do doença estamos, em paralelo, a tentar desenvolver ferramentas para combatê-la”.